terça-feira, 15 de outubro de 2013

Sobre Watchmen e ser feliz

Eu estou muito feliz por estar viva. Eu literalmente agradeço a Deus por isso várias vezes por dia. O engraçado é que isso é algo totalmente novo pra mim.

Eu tenho 19 anos. Eu sou bem jovem. Contudo, eu passei 18 anos sofrendo muito. Eu fui uma criança extremamente melancólica, eu tentei me matar pela primeira vez com 10 anos. E às vezes eu achava que meus problemas eram as circunstâncias desfavoráveis, em especial questões familiares. Muito pior foi quando comecei a achar que o problema estava em mim - que eu simplesmente tinha vindo a esse mundo quebrada de um jeito irrecuperável. E suicídio é uma ideia que faz muito sentido quando você acredita que é quebrada de um jeito irrecuperável.

Atualmente, eu me sinto, totalmente bem. Como disse a May F., aquela linda, "É como ser um bebê, fascinado com as próprias mãos e pés". É uma ótima definição. É delicioso mudar sua ótica sobre tudo. Redescobrir beleza em coisas pequenas e simples.

Na série de quadrinhos Watchmen (senta que lá vem spoiler), existe um personagem chamado Dr. Manhattan. Ele é um cientista que sofre um acidente no laboratório e se torna uma espécie de mutante com vários poderes. Ele tem um romance com uma moça, e após ela deixá-lo, por ele ser demasiadamente frio e inacessível, ele resolve ir embora da Terra.

Numa época muito péssima da minha vida, eu me identificava com o trecho que o Dr. Manhattan diz a sua ex companheira, quando ela vai vê-lo em Marte:
"Quando você me deixou, eu deixei a Terra. Isso não lhe diz nada?". Eu me identificava com esse trecho porque eu acreditava que com o rompimento de certos laços, eu não tinha mais o que fazer aqui. Eu queria partir da Terra, também.

Atualmente, eu me identifico é com outro trecho:
Dr. Manhattan: Milagres termodinâmicos… eventos tão improváveis que são impossíveis na prática, como oxigênio virar ouro espontaneamente. Eu quero muito observar algo assim. No entanto, em cada par humano, milhões de espermatozóides avançam rumo a um só óvulo. Multiplique as possibilidades por incontáveis gerações, junte à chance de seus ancestrais estarem vivos; de se encontrarem; de conceberem esse precioso filho; essa exata filha… Até mesmo sua mãe amar um homem que tinha todas as razões para odiar, e dessa união, das milhões de crianças competindo pela fertilização, foi você, apenas você que emergiu… extraindo uma forma específica desse caos de improbabilidades, como o ar se transformando em ouro… Isso é o pináculo do improvável. O milagre termodinâmico.  
Laurie: Mas… se eu, meu nascimento, se isso for um milagre termodinâmico… pode-se dizer o mesmo de qualquer pessoa no mundo!  
Dr. Manhattan: Sim. Qualquer pessoa no mundo. Mas o mundo é tão cheio de pessoas, tão repleto desses milagres que eles se tornam lugar comum e nós esquecemos… eu esqueci. Nós contemplamos continuamente o mundo e ele se torna opaco às nossas percepções. No entanto, encarado de um novo ponto de vista, ainda pode nos tirar o fôlego. Vamos… enxugue as lágrimas, porque você é vida, mais rara do que um quark e mais imprevisível do que qualquer sonho de Heisenberg; a argila na qual as forças que moldam a existência deixam as impressões digitais mais visíveis. Enxugue as lágrimas… e vamos para casa.

Eu tenho um milagre termodinâmico preferido, cuja mera lembrança me faz sorrir e querer continuar. Mas todes somos milagres.

É muito novo para mim enxergar a minha vida como preciosa, e não um fardo. É novo e lindo. Quando eu tomava antidepressivos, eu sentia que eles me davam uma paz artificial, como se nada pudesse me perturbar. E de fato, era artificial. Agora é real. Adversidades e vicissitudes virão, fazem parte da condição humana nessa fase de nossa existência. Porém, hoje sei que sou forte o bastante para enfrentar o que acontecer. Hoje sei que viver é possível e incrível. Hoje sei que quero continuar. Hoje sei que enquanto eu estiver aqui, eu posso evoluir e tentar fazer o máximo de bem possível para outres.

Estou muito feliz por estar viva.

2 comentários:

  1. Parabéns por você lutar contra um problema sério desses e levar a melhor! Imagino que não deva ter sido nada fácil. Você é uma guerreira, assim como tantas mulheres que seguram uma família sozinhas, até porque, no Brasil isso é um axioma terrivelmente incômodo para nossa sociedade patriarcal e retrógrada!

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  2. Giovana, fico feliz por vc estar feliz. Estou aqui começando a escrever um texto também, pq vc inspira as pessoas e tem tantos amigos especiais que só provam o quanto vc é especial. E o comentário acima também é ótimo. Há uma geração, essa sua, que me dá esperança que o mundo possa ser mais justo, menos machista e patriarcal. Te entendo na sua dor e na doença (depressão é doença da alma), acredito que quanto mais a gente sabe, mais sofre, o que deve ser feito é transferir esse sofrimento para algo produtivo e útil. Vc faz isso o tempo todo e nem percebe. Ou então começou a perceber e por isso sente-se assim, feliz. Isso pq não te conheço ao vivo, mas pelo que escreve, como escreve, sei tanto de vc.
    Hold On

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