domingo, 4 de maio de 2014

O Peixe

"Eu sou daime, eu sou amor
A estrela que vem chegando, ela vem me iluminando na estrada do amor"
https://www.youtube.com/watch?v=wYTT_czUVBY

Tem coisas que são tão lindas, tão lindas, que parece que me doem um pouco. Essa música é uma delas.

Esta, de Oxum, em iorubá, é outra: https://www.youtube.com/watch?v=eSxEZBzgJ10

Outra é essa aqui: O Peixe.
https://www.youtube.com/watch?v=eSxEZBzgJ10

Um dos autores dessa música era um baixista por quem minha  mãe foi apaixonada. E eu amo essa música. Ela tem um crescendo maravilhoso. Parece que vai florescendo, crescendo, sinuosa, errante, mas certa, vibrante, rítmica, viva, viva, dentro de mim e chegando num ápice tão lindo.

E aí, às vezes, eu choro.

Esse ano, eu estava voltando do trabalho quando ouvi uma música ao vivo em uma das ruas e resolvi atravessar para ouvir mais de perto. Bati o olho no letreiro: Guinha Ramirez, que havia sido amigo da minha mãe e um dos membros dessa banda. E, na sequência, começaram os primeiros acordes de O Peixe.

E eu chorei. Chorei. Chorei. Na frente de todo mundo, dos músicos que ficaram espantados com minha reação, do próprio Guinha, que não me reconheceu, pois provavelmente tinha me visto pela última vez quando eu tinha uns 7. E hoje eu tenho 19.

Minha mãe tatuou um peixe dourado na nuca por causa dessa música (ou desse músico). O peixe foi inspirado na capa de This Desert Life, do Counting Crows. Outra banda que ela amava. Outro músico que ela admirava.

E eu um dia me tornarei música. Canto bem, toco mal. Escrevo bem. Amo bem.

Uma vez, em 2011 ou 2012, minha mãe foi me ver, e ela estava muito, muito triste. E disse-me que pedia desculpas por ter me colocado no mundo (eu sempre disse que ela devia se desculpar por isso), que havia sido um ato de profundo egoísmo para fugir da solidão, mas que havia funcionado, porque eu era a pessoa mais parecida com ela no mundo.

E ela também era a pessoa mais parecida comigo.

Sinto saudades. Tem dias que é doce, tem dias que rasga. Nesse exato momento, adoça mais do que rasga. Mais tarde, não sei.

Por mais de um ano, essa lembrança dela dizendo que pedia desculpas me atormentou, porque ela finalizou esse diálogo dizendo que esperava que um dia eu encontrasse um lugar para mim, porque ela nunca encontrara.

E por Deus, como isso me destruía. A dor de saber que ela passou 53 anos neste plano sem sentir que tinha encontrado seu lugar, a dor de eu aos 18 ainda não ter encontrado e ter perdido totalmente as esperanças de encontrar. Eu achei que acabaria como ela. Por diversas vezes, tive certeza.

Já não acho isso. Acho que há sim lugar no mundo pra mim, embora eu ainda precise achá-lo. E acho, também, que viver de um jeito são, honesto, limpo, amoroso e artístico é um tributo muito mais adequado ao meu amor por ela do que segui-la precocemente, violentamente. Prefiro mostrar minha lealdade honrando o que ela acreditava.

Que minha vida seja um tributo à sua memória, a gratidão que tenho a ela por ter me posto aqui, e a Deus por estar me dando as oportunidades de curar-me. Às vezes sinto tristeza por querer que ela desfrutasse disso, da cura, do poder de uma comunidade espiritual amorosa. Contudo, ela dizia que a melhor forma de agradar uma mãe era ser gentil com os filhos. Que de alguma forma meu bem-estar a nutra, do outro lado. Sinto saudades da minha mãe Maria. Ela rege o meu astral.

Como diria Saramago, "Encontramo-nos noutros sítios."
E como diria Guimarães Rosa, o escritor preferido dela, "Qualquer amor é um pouquinho de saúde, um descanso da loucura."

Que meu amor nos cure a ambas. Que Deus te embale até nosso reencontro. Que mamãe vá em paz e possa retificar-se na próxima. Que descubra a fagulha divina dentro de si.

Que mamãe seja luz. Como, no fundo, sempre foi pra mim.

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