segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

but you're so young

o menino bonito
dos olhos cansados
da voz baixa
das roupas pretas
desgastadas
melancólico
passos lentos
sorriso lindo
costas largas
caderno rosa

o menino doce
profundamente misantropo
assustado
fragilizado
adorável
que gostava de crust
e um pouco de mim

o menino alto
reservado
perspicaz
amargurado
ansioso
depressivo
amado

o menino lindo
que pegou meu tambor
e colocou sobre a mesa
e tentou me ensinar um pouco
antes da prova
e eu mal escutava
aflita demais
meses antes de o menino
tão jovem
e tão tímido
se tornar o menino
que meu coração escolheu

o menino que amei
e que ainda amo
na calada da noite
baixinho o bastante para que ele possa escutar
se assim quiser
se quiser a mim

o menino sincero
que só queria um pouco de paz
e eu quis ser a paz dele
e ele quis seguir
sem mim

o menino que é bem vindo
dentro do meu coração
e a quem espero que a vida cure
mais do que já feriu

o menino livre
a quem eu quero bem
que eu quero que seja feliz
a despeito dos caminhos que decidir

mas se ele escolher estar nos meus braços
para cuidar e ser cuidado
para compartilhar o árduo fado de viver
se assim ele quiser
eu estarei aqui
enquanto couber
na verdade dos tempos
na ressonância de coexistirmos
próximos assim
com sua  presença única e doce
junto a mim.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

all we ever wanted was everything

l'amour c'est une patifarie

Eu lembro de seus olhos, e eu lembro do seu calor, e eu lembro dos seus braços, e eu lembro das suas lágrimas. E eu lembro da sua voz monocórdia, dos seus olhos tão cansados e tão doces, e de como você às vezes fechava os olhos enquanto ria. E eu lembro de você no meu colo, e eu lembro de eu no seu. E eu lembro daquela vez em que você literalmente dormiu nos meus braços, com a cabeça no meu peito, na cama, e de como eu tive dor nas costas depois, e do quanto valeu a pena. Eu lembro de todos os "eu te amo" que nunca me foram respondidos, exceto por gestos de delicadeza condescendente. Como me puxar mais pra perto. Mas jamais dizer "eu também". Eu lembro da sua inocência, da sua leveza pesada e ambígua, dos seus silêncios e de como seu carinho era bom. De como era acolhedor acordar no meio da noite, angustiada, e poder passar o braço ao seu redor. E você não movia um músculo no sono tão pesado. Eu lembro de como a roda do dharmma girou, e eu acordava antes de ti pra te levar chocolate quente, como tanto já fizeram por mim. Para que seu acordar doesse menos. Para que você se sentisse amado. Para que se sentisse profundamente amado, assim queria eu. E assim se sentindo, pudesse se permitir talvez sentir o mesmo por mim. E pudéssemos seguir na apoia mútua dos bichinhos, um cuidando do outro neste mundo hostil. E eu lembro do quanto eu gostava de te ver tocar violão, do quanto eu gostava de fazer nada do teu lado. E eu lembro de dormir nos seus braços ouvindo Sacrilege dia 20 de novembro, um dia tão difícil para mim, por ser anterior ao 21. E eu lembro de tudo que eu te dei e de tudo que você deu para mim. Só pudemos dar o que tínhamos. Mas o que eu tinha foi seu. Resta-me agora deixar a medicina que é o tempo passar para desanuviar as mágoas da unilateralidade do fim. O fim sempre chega. E frequentemente parece ter chegado cedo demais. No tempo que nos coube eu fui feliz. Uma pessoa tão triste me fez feliz. Tenho esperança de que tenha sido mútuo. Dentro do possível.


"Can you take me to your heaven, I'm ready
I know the weight of my heart is too heavy
I will love you with all of the love that I have
Even if that means there's none left for me

I'll carry your cross now, baby
It's a blasphemous world today
(...)
I'll bury your pain now, baby
Are you happier now, happier now?"
Cold Cave - Underworld USA

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

por todas mis relaciones II

para minha madrinha amada Lua Bittes

tenho estado à flor da pele
mas de um jeito bom
de um jeito doce


de quando a imensidão da vida
multiforme
mareja os olhos
e é sentida no peito
e no entanto
não intoxica de desespero
emerge o clarão
do entendimento que leva ao seguimento

em julho de 2013 eu decidi escolher a vida
em maio de 2015 foi difícil manter a decisão
fevereiro de 2016
e eu reitero os votos

tenho estado à flor da pele
mas de um jeito bom
de um jeito doce
de quem quer viver
e não quer morrer
sabe?
eu sei.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

por todas mi relaciones

amor mole em alma dura
tanto bate até que cura?

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

depois da queda

Para Kenah, Clarisse e Juliana

eu amei um rapaz
e eu o amei
tão profundamente
tão intensamente
tão desesperadamente
que mesmo amando tantas outras coisas
eu queria deixar a Terra
quando a jornada junto a ele
acabou

nove meses depois
a vida floresceu em mim
a poetisa em mim
a curandeira em mim
a cozinheira em mim
a amiga em mim
a irmã em mim
o ser divino em mim
todas as partículas emergiram
e continuam a emergir
e seguindo e buscando
eu fui encontrando significados
razões e sentires

eu lembro daquele dia no hospital
e eu lembro que a dor era tão imensa que eu sentia que ela me deformava
e eu tinha quase vergonha das amigas minhas que estavam ali
e elas me viram num estado de desespero tão cru
e me amaram
e eu as amei
e tenho amado tanta gente
não romanticamente
e meus pedaços pela estrada
não são metades arrancadas
são fagulhas do eterno
são pedaços cintilantes lapidados na dor
são pedaços de cristais
com os quais presenteio minhas irmãs
e meus iguais.

domingo, 24 de janeiro de 2016

dormir só

durante as madrugadas
eu penso em quem eu amo
e do lado de quem não durmo mais

e eu me pergunto
se as pessoas que me amaram
também pensam
vez ou outra
no calor do meu corpo pequeno
do lado cama virado pra parede

eu preciso aprender a dormir sozinha
sem tatear pela cama
a falta de um corpo
que me desse segurança
eu preciso parar de procurar um lar
em outro corpo
e me contentar com um teto
com meus gatos
me contentar com o calor do meu próprio corpo
quarenta e poucos quilos de saudades

às vezes eu acho que se eu pudesse curar
a falta da minha mãe
subitamente, peças se encaixariam
minha psique se reorganizaria
e viver
doeria menos
mas cada falta e cada ausência
e cada perda e cada abraço
interrompido
são como sal esfregado nas feridas
são metáforas da saudade
e da dor que nunca passa.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Shine on you crazy diamond

Eu queria escrever um conto sobre saudades.

Sobre transcendê-las.

Eu gosto dos meus contos curtos.

Eu gosto das minhas metáforas e,
como escrevi uma vez,
escrever é a minha metáfora para sobreviver.

Eu queria escrever um conto sobre saudades
sobre como, apesar de tudo
a gente vive com elas
a gente sobrevive a elas
de todas as espécies

Eu queria escrever um conto bonito e eufônico sobre a falta
as faltas
metades soltas das saudades

Como já escrevi, também
quando escrevo sou rainha de um império imaterial
E ao escrever esse conto
eu sentiria que reescrevo levemente minha história
nesse conto haveria alguma lição moralizante sobre escolher lidar
escolher seguir
e ressignificar
as faltas

E eu não consegui escrever esse conto
essa noite
são quase 3 da manhã
e meus olhos estão cansados
e meu coraçãozinho está fatigado
de um jeito que esgota as ideias das metáforas
adequadas
para transmitir esse tipo
de esperança

fica um poema com pouco brilho
um poema que é o que deu pra ser
como todos somos, no final das contas
os sobreviventes do que conseguimos ser
no final das noites.