quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Para Ariadne

essa dor de ser mulher
eu a carrego
e sinto
no meu útero
na minha vulva
nos meus ossos
nos meus olhos
na minha carne
na minha alma



essa dor de sofrer só
de confiar neles sempre com receio
de ter sua subjetividade
construída tanto sobre
o medo

essa dor de ser mulher
e tratada como inacabada
pouco confiável
emocional demais
sempre policiada
em seu existir
essa dor de resistir diariamente
toda mulher a conhece
até mesmo as de extrema direita
apressam o passo ao ver um homem no caminho
na rua deserta
onde habita o desespero

essa dor de transbordar
um sangue desprezado
e seguimos buscando
"criar uma nova vida"
no apoio mútuo
na luta
no silêncio
nos chás e ervas
na dança
na poesia
na angústia
criamos como artistas mulheres
(o "artista" não especificado é homem)
atiramos em várias direções na ânsia
da mera sobrevivência

e então algo rompe o muro
e então a realidade bate à nossa porta
impassível
para rasgar os véus da dor
que tentamos esquecer

nenhuma mulher precisará
olhar longe para ver a violência
está na nossa pele
no nosso sexo
está em toda forma de destruição
que a supremacia masculina
imprime a nossos corpos

e resistimos
e melhor o fazemos quando em união
algumas de nós, porém
se quebram
e se vão
partem antes da hora
tornam a dor seu próprio fim
e esvaem suas vidas
pelas suas próprias mãos

poderia ter sido eu.

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