domingo, 10 de abril de 2022

maturidade


há um preço em se envelhecer cedo
comum que se diga 
"meninas amadurecem antes"
também eu já pensei 
"indígenas amadurecem antes"
ao me deparar com jovens de 14 
com mais seriedade e garra na luta
que quarentões esquerdomachos

não passa de romantização do sofrimento
passar perrengue, fome
violência doméstica, problema de moradia
perder território
seja terra
seja o território-corpo
invadido desde a infância 
olhares abjetos
o medo constante
a espreita
uma polícia que não se movimenta
para salvar a vida de uma mãe
mas se movimenta pra cercear
um baseado consensual na praça 

e chamamos de maturidade, por vezes
a seriedade
precoce
que talvez
nem deveríamos ter 
nem deveríamos ter
que ter 
não foi escolha
não há escolha
quando é sua carne na jogada
a vida dos seus
quando se cresce se preocupando com sua mãe
não ser morta
com sua comunidade
não ser morta
se cresce, sim
se amadurece? talvez
a que preço?

levar a vida a sério
tem sua beleza
quando se é obrigada a isso, porém
desde tenra idade
não é tão belo 
é sobrevivência
e saudade infindável da infância
que pouco veio, pouco houve

aprender a ter leveza
tem sido um dos desafios e objetivos
dos meus últimos anos
contudo, compreendi
jamais rirei com a leveza
de quem pôde ser pequeno
quando se era pequeno
eu tive de ser grande
quando não tinha nem 30kg
hoje tenho 42
e um inventário de cicatrizes
acompanhado, todavia
por um inventário de alegrias
celebro minha própria força
e crio novas narrativas
é em comunhão que me curo 
verbalizando o que é injusto
para que o que faltou a mim
seja abundante a todes.

 

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