quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

The Wall - Breve análise

No meu 2º ano do Ensino Médio, em 2010, tive que fazer um trabalho mais ou menos no formato de uma monografia, com um capítulo. Escolhi como tema o filme The Wall, baseado no álbum homônimo do Pink Floyd. Resolvi publicar porque curti, rs

“Ele é o menino que Papai Noel esqueceu
E Deus sabe
Ele não queria muito.”
Pink Floyd – The Little Boy That Santa Claus Forgot


“The Wall é sobre “o caminho do meio” e a percepção de que o que você faz afetam os outros tanto quanto as coisas que são feitas a você. É sobre ser um indivíduo, mas não ao ponto de alienação social e pessoal; é sobre como uma pessoa pode ser tão consumida por ódio que se torna a coisa que ela mesma odeia; é sobre o perigo de fazer deuses de homens; é sobre a importância da comunicação, o vácuo do excesso, a importância dos pequenos momentos, e acima de tudo, é sobre responsabilidade pessoal, comunal e social”

- Bret Urick. Disponível em: http://www.thewallanalysis.com/faq.html#essay


1 RESUMO

The Wall é um filme/ópera-rock baseado no álbum conceitual homônimo da banda Pink Floyd. Conta a história de Pink, um garoto cujo pai morreu na guerra, possui uma mãe superproterora, é humilhado por um professor frustrado, torna-se um rockstar, e acaba por surtar, afundando-se cada vez mais no isolamento e alienação iniciados por ele mesmo. É uma obra complexa e cheia de simbolismos, construída sobre as imagens e letras de música, havendo pouquíssimos diálogos no filme. O filme foi dirigido por Alan Parker, escrito por Roger Waters, vocalista, baixista e letrista do Pink Floyd, e estrelado por Bob Geldof, e mistura animações com realidade. Fala sobre alienação, isolamento, guerra, solidão, sociedade, consumismo, traumas, etc. tudo brilhantemente acompanhado e descrito por rock de alto nível.

2 INTRODUÇÃO

Este trabalho falará sobre o filme The Wall, baseado no álbum conceitual homônimo da banda de rock progressivo inglesa Pink Floyd. Produzido em 1982, foi dirigido por Alan Parker, e seu roteiro foi escrito por Roger Waters, vocalista, baixista compositor do Pink Floyd.

Bob Geldof interpreta Pink, um garoto cujo pai morreu na 2ª Guerra Mundial, perda essa que sua mãe superprotetora tenta amenizar com mimo excessivo. Pink é humilhado por seu professor frustrado por escrever poemas, o que não o impede de se tornar um rockstar de sucesso e casar-se. Porém, ele não resiste a pressão e acaba entrando em surto. Pink, então, constrói “O Muro” (The Wall, em inglês), metáfora para o isolamento emocional no qual mergulha.

De forma extremamente simbólica, The Wall vai além da história de Pink: o filme critica, instiga, provoca, choca, demonstra. A sociedade, as relações humanas, a música, a família, enfim, vários são os pontos levantados ou sugeridos. Humildemente, tentarei introduzir a obra.

3 THE WALL, EM SI: HISTÓRIA E ANÁLISE

Como brevemente abordado na introdução, The Wall pode ser enquadrado como ópera-rock. Este termo designa produções musicais que combinam características de ópera com letras de rock, ou seja, tentam contar uma história através de letras, personagens, cenário, etc. Exemplos de ópera-rock, além de The Wall, incluem: Tommy, American Idiot, The Black Parade, etc.

Focada na vida de Pink, The Wall possui nítida influência da vida de Roger Waters, baixista, compositor e vocalista do Pink Floyd. Tal como Pink, Waters perdeu o pai na guerra e tornou-se um rockstar de enorme sucesso. Deve-se também levar em consideração que as letras do álbum homônimo, no qual baseia-se o fime, foram, em sua maioria, compostas por Waters, o que acentua a influência do genial compositor. O roteiro, aliás, foi escrito por ele.

Sem tratar de problemas sociais como fome e miséria, The Wall ainda assim fala (e critica) a sociedade, especialmente na pressão e censura silenciosas que exercem, e os reflexos disso no universo individual de cada um.

O filme se inicia com a música The Little Boy That Santa Claus Forgot, cantada por Vera Lynn. A letra, que fala de um menino esquecido pelo Papai Noel, apesar de seu pedido ser singelo, é uma introdução ao drama de Pink, que se sente decepcionado e frustrado em seus desejos mais simples, como ter um pai.

Pink perdeu o pai na 2ª Guerra Mundial, como conta a música When The Tigers Broke Free – Part 1. Essa perda se reflete no comportamento da mãe de Pink, superprotetora e com mimos excessivos (conforme a música Mother).

Em In the Flesh?, um homem com trajes de ditador totalitário questiona aos adolescentes presentes se eles desejavam ir ao show em que estão, com ironia. Ao final, o ditador afirma: “If you wanna find out what's behind these cold eyes, you'll just have to claw your way through this disguise.” (“Se você quer descobrir o que há por trás destes olhos frios, você terá de rasgar seu jeito através desse disfarce.”) Esse trecho já dá a idéia de construir máscaras para sobreviver, em busca de proteção. Os adolescentes são brutalmente espancados por soldados.

The Thin Ice continua a idéia de fragilidade do indivíduo perante a sociedade: “If you should go skating / On the thin ice of modern life / Dragging behind you the silent reproach / Of a million tear stained eyes / Don't be surprised, when a crack in the ice / Appears under your feet / You slip out of your depth and out of your mind / With your fear flowing out behind you / As you claw the thin ice” ( Se você fosse patinando sobre o gelo fino da vida moderna / Arrastando-se atrás de você, a censura silenciosa de um milhão de olhos borrados de lágrimas / Não se surpreenda quando uma rachadura no gelo aparecer debaixo de seus pés / Você desliza até não dar mais pé e fica fora de si / Com seu medo fluindo atrás de você enquanto você arranha o gelo fino.”

When The Tigers Broke Free – Part 2 retoma a morte do pai de Pink, e descreve a carta pomposa e oficial que trouxe a notícia. Já em Goodbye Blue Sky, é feita referência à Guerra, e seus trechos falam de pessoas assustadas em busca de abrigo, apesar da promessa de “um admirável mundo novo”.

Extremamente simbólica, a sequência de Goodbye Blue Sky começa com uma pomba branca voando para fugir de um gato. A pomba, porém, é destroçada por uma sinistra águia negra, que mancha os céus de sangue. A águia negra voa como um avião. Aviões de bombardeio assustam pessoas que andam como animais e usam máscaras de gás. Os aviões tornam-se crucifixos. Um esqueleto vestido tomba no chão, após fazer um gesto de desistência. A bandeira da Inglaterra torna-se uma cruz sangrenta. A música diz “As chamas há muito se foram, mas a dor permanece”. O esqueleto vestido levanta-se, e réplicas dele se tornam crucifixos. O sangue oriundo da cruz escorre por um bueiro.

A águia negra está presente no brasão de armas da Alemanha, embora isso não seja mostrado no filme. É, portanto, uma alusão à Segunda Guerra Mundial, quando a promessa do 3º Reich de Hitler (o “admirável mundo novo”) assustava inocentes. O desperdício de sangue e vidas humanas, bem como a destruição, causados pela guerra, também são simbolizados.

Uma das cenas mais famosas de The Wall é durante a canção Another Brick in the Wall – Part 2, com crianças que pedem para seus professores os deixarem em paz, pois estão cansados dos controles de mentes e sarcasmo sombrio. Essa canção, bem como The Happiest Days of Our Lives, servem de pano de fundo para mostrar o professor frustrado que humilha Pink, por escrever poemas, e outros alunos, por razões diversas.

Mother é escrita em primeira pessoa, e Pink (ou Waters?) indaga sua mãe acerca do que fazer sobre diversos assuntos. Dentre eles, pergunta se deve construir O Muro. A mãe diz que certamente o ajudará nisso, bem como mantê-lo próximo a ela e monitorar suas namoradas e companhias.

Empty Spaces mostra duas flores com aparência de genitais, e a flor que representa a mulher devorando a que simboliza o homem, de forma agressiva, mutilando-o. Ora, a mãe de Pink o sufoca e o prejudica emocionalmente, e sua esposa o trai (Pink não enxerga que causou isso, ao ignorá-la e fechar-se em seu próprio mundo); na visão dele, as mulheres são, de fato, destrutivas. Em What Shall We Do Now?, listam-se de coisas comuns a sociedade consumista, mas conclui-se que, no final, “Nunca relaxar de verdade, com nossas costas contra o muro”. As imagens vão mostrando o muro sendo construído rapidamente, transformando flores em arames farpados, um bebê num soldado violento, uma Igreja em algo parecido com uma boate ou cassino. Enquanto isso, uma face grita, de dentro dos tijolos: possivelmente um eco do desespero de Pink. Ao final da música, dentre outras imagens, há um baixo, mais uma provável referência a Roger Waters, baixista.

Outro ícone que surge a partir de What Shall We Do Now? é o martelo, que pode simbolizar tanto o desejo de Pink de pôr o muro abaixo, quanto a destruição. Após a animação, mostra-se uma cena em que vandalizam vitrines, quebrando-as com martelo. Os vândalos são presos, mas duas senhoras recolhem coisas das vitrines destroçadas. Pode-se interpretar esse trecho como a corrupção de pessoas que o estereótipo diz estarem acima de suspeitas, quando trata-se do consumismo.

A canção Young Lust, comparada com o restante das letras do Pink Floyd, pode ser vista como uma paródia de músicas de rock 'n' roll populares cujos autores usam sua fama meramente pra obter mulheres. Ao mesmo tempo, retrata a tentativa de Pink de “vingar-se” de sua esposa com uma groupie. A moça o acompanha até sua casa, e tenta seduzi-lo, mas ele não tira os olhos da televisão.

Em One of My Turns, Pink continua contemplando a televisão, enquanto a música aparentemente explica seu comportamento: “Day after day, love turns grey / Like the skin of a dying man / Night after night, we pretend it's all right / But I have grown older and you have grown colder and nothing is very much fun, anymore” (“Dia a dia, o amor se torna cinza como a pele de um homem morrendo / Noite após noite, nós fingimos que está tudo bem / Mas eu fiquei mais velho e você ficou mais fria / E nada mais é muito divertido”) Provavelmente, estes versos se referem a esposa de Pink, e não a groupie, que ele acabou de conhecer.

Ainda em One of My Turns, a música diz que “And I can feel one of my turns coming on”, ou seja, “E eu posso sentir uma de minhas crises vindo”. De fato, isso acontece, e Pink surta, destruindo inúmeros pertences e o próprio quarto, deixando a groupie assustadíssima. Ele tenta justificar-se “Don't look so frightened, this is just a passing phase / Just one of my bad days” (“Não fique tão assustada, é só uma fase passageira / Um de meus dias ruins”), mas continua a destruir o quarto e atirar coisas perto dela, e ela foge. Pink grita com ar desvairado para a cidade, Take that, fuckers” (“Peguem isso, otários”) pendurado em sua janela, após atirar sua televisão através do vidro, sem importar-se com suas mãos cortadas.

Don't Leave me Now é um apelo de Pink, que vê-se abandonado por todos, enquanto exibem-se cenas de sexo entre sua esposa e o amante. O rockstar em surto aparece em seu quarto, assistindo TV, enquanto uma flor de aparência feminina e sinistra faz referência à sua mãe, encurralando-o.

Another Brick in the Wall - Part 3 é uma sequência de mais destruição enlouquecida de Pink, bem como diversos flashbacks de sua vida. Goodbye Cruel World soa como uma despedida de suicida, embora trate mais de morte espiritual/emocional do que física. A música Is There Anybody There? quase não possui letra (apenas é repetido o título algumas vezes no início, que em português é “Tem alguém aí fora?”), e consegue ser eloquente mesmo assim, especialmente ao combinar-se sua melodia triste com as imagens de Pink construindo uma fileira com suas coisas destruídas, e, após isso, depilando todo seu corpo, cabelos e sobrancelha.

Nobody home é um triste e sarcástico inventário de Pink, enquanto ele assiste TV. “I've got a strong urge to fly / But I've got nowhere to fly to” (“Eu tenho uma forte ânsia de voar / Mas eu não tenho para onde voar”) é uma provável referência ao desejo de Pink de fugir, sair do muro que o aprisiona, porém, ele não sabe como fazer isso, nem como agir depois.

Pink criança visita o Pink adulto, demente e sozinho num hospício vazio, e foge, com medo. Vera é uma homenagem a Vera Lynn, cantora inglesa muito popular durante a 2ª Guerra Mundial, por suas letras incitarem esperança na nação em guerra. Vera Lynn, aliás, é quem canta a música de abertura de The Wall, The the Little Boy That Santa Claus Forgot.

Bring the Boys Back Home, assim como Vera, mostra cenas numa estação de trem, com o retorno dos soldados após a Guerra. Pink criança vaga sozinho, talvez com a esperança inconsciente de encontrar seu pai, morto quando ele era bebê.

Comfortably Numb mostra o apartamento de Pink sendo invadido por seus agentes e médicos, enquanto a letra parece falar clichês médicos: “Você pode me mostrar onde dói?”, “Somente uma picadinha”, e o refrão fala de dor e retorno, e de uma febre que o eu lírico teve quando criança. “Confortavelmente entorpecido” (Comfortably numb), portanto, pode fazer referência tanto a febre e ao torpor causado pelos medicamentos que o médico injeta nele, quanto ao estado no qual Pink mergulha para sobreviver a dor emocional. Além disso, mostram-se flashbacks da infância de Pink.

O trecho “This is not how I am” (“Isso não é como sou”) mostra o desespero de Pink ao ver no que está se tornando. A música encerra os flashbacks de Pink, e conclui: “The child is grown, the dream is gone / I have become comfortably numb.” (“A criança cresceu, o sonho se foi / Eu me tornei confortavelmente entorpecido.”)

In the Flesh mostra Pink como um carismático ditador de inspiração nazista/fascista, que diz ter vindo substituir Pink. Ele incita o ódio na platéia, e seus soldados perseguem gays, negros, judeus e usuários de maconha. Sua atitude é aplaudida e aprovada pelo público, que marcha, mães oferecem seus bebês para Pink beijar. É importante ressaltar o caráter satírico dos trechos preconceituosos dessa música, que refletem os regimes totalitários discriminatórios, e não a opinião da banda Pink Floyd.

Run Like Hell continua a mostrar o regime totalitário comandado por Pink, e seus soldados, que estupram a namorada branca de um negro, espancado. Waiting for the Worms continua a falar do regime, construindo uma forte referência ao nazismo/fascismo e as destruição e perseguição disfarçadas de nacionalismo. Enquanto isso, martelos (o símbolo de Pink totalitário) marcham.

Stop é um apelo desesperado de Pink, num banheiro público, que quer ir para casa, sair do show e tirar o uniforme. Mas, mais importante, ele se questiona se a culpa de tudo que está ocorrendo é dele.

The Trial, “O Julgamento”, é uma animação que mostra Pink sendo acusado de mostrar “sentimentos de natureza quase humana”. Além disso, seu antigo professor aparece e diz que poderia tê-lo corrigido, mas foi impedido pelos artistas e sensíveis. Sua mãe também o acusa de abandoná-la, e o eu lírico declara-se louco. Por fim, o juiz afirma estar enojado com Pink, e decreta como pena que o muro seja destruído.

Outside The Wall encera brilhantemente o filme, fala sobre o muro e sobre o desejo e necessidade de colocá-lo abaixo, presente nas pessoas que amam, sensíveis e artistas, enquanto uma criança brinca com os fragmentos do muro, numa mensagem tanto de otimismo quando de alerta para não recomeçar o ciclo que leva ao muro.


3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apesar do desagrado manifestado por Alan Parker, o diretor, e Roger Waters, o roteirista, com o resultado final, The Wall é uma obra brilhante e simbólica, carregada de críticas, alertas e alguma esperança.

O muro é uma metáfora bastante eficaz para as proteções que construímos em busca de sobrevivência, de enquadrar-se na sociedade, porém, como no filme, o muro pode causar isolamento, alienação e dor.

Cabe a nós conhecer os limites e forma mais adequada de resistência emocional, para não chegar no ponto de Pink, de embotamento emocional profundo e pouco humano. Proteger-se é necessário, mas comunicar-se, viver e amar, também.

REFERÊNCIAS

PINK FLOYD THE WALL. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Flórida: Wikimedia Foundation, 2010. Disponível em: . Acesso em: 17 nov. 2010.

URICK, Bret. The Wall Analysis. Disponível em: Acesso: 17 nov.de 2010.

PEZZIN, Erico C. The Wall - Uma obra de arte conceitual. Disponível em: Acesso: 18 nov. 2010.

?title=Rock_brasileiro&oldid=21352754>. Acesso em: 23 ago. 2010.

Um comentário:

  1. você sabe que uma pessoa é foda quando ela escolhe pink floyd prum tema de trabalho. essa esperteza te garante uma poltrona na minha bolha rosa. <3

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